Em um frio de quinze graus. O fim do café e o cristalizar do
açúcar. A noite que somente um poderia ver chegar. Luzes amarelas passam pelas
grandes janelas, gotas rápidas de chuva que somem pela cidade, uma menina
esquece o guarda chuva, ou assim, e o volta para pegar. Um casal se beija de
forma a guardar um segredo, além de seus desejos, pessoas sem rostos conversam
sem nomes, rostos sem pessoas ficam mudos a tela do celular. Uma pessoa no mesmo
lugar, por tanto tempo. Uma recepção morta e fria, como as paredes isoladas de
um antigo casarão, fabrica, os pássaros procuram refugio, galinhas de um metro
e meio, sentadas em janelas. Fria, branca, pedra, barro, concreto, aço. Antes
rosa. Em algum calor, de nós mesmo, em algum lugar dos mármores bem alinhados. Víscera
exposta, carvão, nos dedos, pressagio, cinza, politica, historias, charlatão,
magico, palavras, adolescente vaidoso, vozes, dentes, parelho, maquiagem, duas línguas,
te distrai. O açúcar vira melado, o açucareiro ganha uma saia, fantasia,
fantasma. Ônibus passando por debaixo dos pés. Ar condicionado, seu ar condicionado
a minha respiração, minha pulsação, ao meu desejo, aos meus sonhos, ao meu
despertar, minha derrota, minhas historias. Seu ar é meu ar, seu ar não tem condomínio,
como parada inútil em trilho sem passageiro, trem.
- Vamos sentar com eles? Ele olha para os pulsos, mão, dedos,
olha para as janelas enormes, a luz amarela dos postes saindo por de trás, o
mural colorido, olha para os enormes olhos negros dela. - Não. Melhor, não. Ela
foge olhos, como a se a lamentar por dois segundos. Ele volta, desta vez ele
muda de ideia, sem aquele peso de que estava ali existindo alguma coisa o
incomodando.
- Faremos, assim. Então ele avança sobre a mesa e com aquela
expressão infantil começa explicar um plano, um parcial plano por superficial
que fosse, onde fosse, os levaria a dois lugares ou mais. – Vou até eles, me
apresentarei, e assim mesmo também vou te apresentar, vou dar uma cena, esta
cena esta na minha cabeça, e nada mais, você, bom, acredito que ao final da
terceira frase minha você já vai entender suas ações, você gostaria de fazer
teatro, certo? Então vamos improvisar um bocado, começo e depois você só leva.
Ela olha para ele meio receosa, deixa escapar um pequeno
sorriso, mas concorda com um brilho nos olhos com a ideia. Então ele não
esperando muito das ações dela coloca em pratica sua parte. Salta de sua
cadeira e vira para grupo sentado próximo e se apresenta.
- Olá senhores, me nome é Eduardo, e aquela é minha amiga
Ester, desculpe estar importunando a conversa de vocês, mas gostaria de saber
se podemos nos juntar a vocês nestes últimos minutos que estaremos por aqui.
Uma das meninas do grupo da uma resposta positiva e olha para os demais que se
olham ao mesmo tempo enquanto procuram lugares entre as mesas onde os dois
poderiam sentar. Com o comum acordo de todos eles se sentam, Eduardo senta
entre dois garotos, e Ester fica entre uma garota e um rapaz.
- Bom, desculpe-me agora que já fiz toda essa quebra social,
sobre que falavam?
Duas horas depois no cinema. Seria legal poder dormir ao seu lado,
ou talvez acordar de um sono quente e saber que sua pele esta por ali, próximo
a algum abraço meu. Queremos tantas coisas não é? Parecemos crianças em uma
enorme loja de brinquedos chamada vida. Talvez tudo que fosse desejar hoje era
ficar em silencio ao seu lado. Ver quem sabe, toda a trilogia de Roy Anderson, Canções
do Segundo Andar, Vocês, os Vivos e lembrar que foi aqui, onde comecei a ver Um
Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência. Dormir talvez, ou esperar
que você fosse me preocupar com alguma coisa que deixou pra trás, ou não.
- Então como falava senhoras e senhores, conheci Ester hoje
mais cedo, estava hoje na livraria do shopping e enquanto tentava surrupiar
algum livro ela chegou a mim me perguntando como se falava Camis, Proust, não,
isso era uma cerveja, mas ai não teria
“u”, bono, assim que meus olhos bateram nela fiquei enamorado pela sua
beleza. Todos riram, ela tenta começar uma frase, fazer piada, mas ele levanta
voz e continua. – Então essa bela senhorita de boa fé com meu espirito me fez
uma proposta e tenho que antes das vinte duas horas impressionar ela, que além da
pronuncia errada que ensinei a ela, posso lhe fazer alguma alegria, do
contrário ela ira para casa sem me dar ou deixar, telefone ou contato. La-men-tá-vel,
não?
Bateu-me um raio de realidade. E talvez isso tenha me
deixado de mau humor, o dia todo, até, sei lá. Vou ficar muito triste quando
você não mais estiver, ou quando não mais eu puder estar. Esse meu pedaço, meus
quarenta porcento egoísmo ao ser. Então me fica alguma inveja dos que podem te
ter mais, da sorte ou razão ou destino, acaso, sorte. Então olho essa sala
enorme e vazia de cinema, e de como minha vida com você parece tanto isso,
existe tantos lugares para se ficar próximo de você, não sou nem o dono do
cinema, mas que talvez, por uma seção ou duas, bom, eu posso estar ali, sentado
ao seu lado, e que isso me tira todas as partes chatas de sua vida, mas que
isso me deixa sempre, a um bilhete e uma fila, de esperar a próxima vez para
por ali estar. Que falta de compromisso, e aceitar isso me parece tão diminuto
algumas vezes. Mas é o cheiro raro da felicidade, ao menos podemos ter alguma
certeza com nós. E esta nunca vai ser por conveniência.
- Não, ele não esta se saindo nada bem. Ele faz péssimas
piadas, e conta historias que lhe dão uma inclinação social suspeita. Ele é
charmoso, mas isso, bom qualquer um em silencio pode ser.
Nem fome nem frio, talvez a única coisa que fosses mesmo
precisar era algum lugar para ficar com cérebro fervendo, ou com olhos fechados
sonhando. Um dos melhores dias, foi aqui, e tinha sua mão, e parte de algum
silencio, que era meu, era seu.
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